quarta-feira, 22 de junho de 2016

caminhos e percalços


Os raios de sol iluminam o rosto em uma manhã fria. O chão recebe passos que instintivamente caminham até a K-pax peculiarmente particular de cada um. Lugar onde pode-se entregar ao aconchego de se resguardar e até mesmo enfrentar as próprias aflições sem interferir no ambiente ao redor, fora de si. Entretanto a interação é inevitável, pois quando um corpo ocupa um espaço, ele o altera, mesmo que sutilmente.

Sensações delineiam as expectativas desde o início do dia. A liberdade de puxar o ar fresco da manhã o faz sentir vivo como um pássaro. O voar não lhe é um fardo, tampouco o gorjear sua sina e o semear uma prisão. As asas que perpassam o vento, dedilham no ar os sonhos mais tênues de um tempo que ainda não foi registrado. Ele beija a flor que o encanta.

Na construção da respectiva trajetória, perpassamos os fluxos dos outros, interferindo mesmo quando passamos por despercebidos. Andarilhos de interligações de um labirinto de fim desconhecido, nos movimentamos. Idas e voltas, transgressões de paredes, descoberta de novos corredores e sempre a mesma ideia de destino. Observando os caminhantes, percebemos o quanto somos, iguais, semelhantes, diferentes, únicos. Seja em um ponto de ônibus, na rua, ou escritório. Todos juntos em um espaço, todavia separados por infinitos. A mente em espaço e tempo diferentes, cada uma com a trilha sonora que lhe apraz. A interação de silêncios e de olhares vagos enquanto aguardam um certo agora, a próxima deixa.

Os fones de ouvido podem até agredir o tímpano e os cílios da cóclea, mas eles também nos protegem.  Nos exime de interações indesejadas no cotidiano, nos protege enquanto sonhamos acordados com sonhos difíceis, mas não impossíveis (depende do tempo e do passo), nos abstém de ouvir argumentos que ferem ou que provocam repulsa; permitem trilha sonora instantânea nos simples momentos do dia a dia. De certa forma, são instrumentos de paz e de guerra, prisão e liberdade.

Vermelha*, esta noite a lua sangrou meus lamentos, minhas palavras silenciadas, meu choro estancado; e desdenhou do amor pujante de meu coração, latente em minha alma. Brilhante, ela iluminou o orvalho com a esperança de inquietude e caminhos diferentes.

 *Lua de Morango, a cheia de Junho.
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terça-feira, 21 de junho de 2016

esses tais mapas


 
 
Época do Aniversário da morte de C. Jung. Renovam-se discussões, argumentos e conflitos sobre arranjos da psiquê; a desafiadora cartografia mental. Todos têm a facilidade de tentar interpretar e inferir no mapa à sua frente, mas fracassam na observância e manejo do próprio mapa. Há quem mistifique as relações entre realidade, percepção e ação/manifestação, há quem tente tornar raso e não razoável o entendimento sobre as nuances da identidade humana. O tormento da Fé, quando a razão não cabe no momento, dominado pela rima, conduzido pelo que se sente. A razão que não cabe no movimento.

Assustador, o contemporâneo seduz com agilidade e superficialidade a nossa aptidão por preguiça em perceber e conceber as diversas relações e respectivos desdobramentos da realidade. Uma realidade que se apresenta em hiperlinks, em rede. A rede nos aprisiona ao revelar nossos limites de transitoriedade e assimilação do todo a partir das partes e suas conexões com a rede (realidade). Lemos apenas o rótulo dos produtos socioculturais, diante do esforço em coexistir e compreender, nos entregamos a automatismos que alimentam os fluxos sociais.

Neste ínterim, a busca por consolidação de pilares como referência de interpretação da realidade e do que se passa em termos de significado e significante na mente do indivíduo é algo que atravanca a reflexão, uma vez que as pessoas se atêm às fontes e não ao conteúdo. Estacionam a argumentação e os conflitos em determinar as fontes oficiais (Carl ou Sigmund? Dentre outros embates), os argumentos da verdade, e assim gastam energia em aspectos periféricos, enquanto o epicentro da identidade humana e reverberações subsequentes não recebem a mesma atenção.
Assim, acredito ser interessante ir além do eco à beira do abismo e da imagem no espelho. As interfaces de nossa identidade devem ser vivenciadas e questionadas considerando os parâmetros do tempo, da significação coletiva, da absorção individual, da constituição do sistema de relevância de cada um e suas diversas interações no sistema social. "Navegar é preciso. Viver não é preciso [...] Viver não é necessário; o que é necessário é criar.", Fernando Pessoa.